Reflexão sobre a participação da equipe olímpica feminina em Istanbul 2012

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Mais uma vez tive honra de ser o treinador da equipe olímpica feminina. Nesse ano ao contrário de 2010, graças a um sistema classificatório eficiente, tivemos a equipe mais forte possível no momento. Ao contrário da Olimpíada de 2010 na Rússia onde tínhamos uma jogadora com mais de 2000 de rating, esse ano a única que não ostentava a marca por puro azar era Artemis Guimarâes que poucos dias depois de iniciada a olimpíada voltou a esse patamar.

Uma reflexão importante é a evolução do xadrez feminino brasileiro que pela primeira vez na história contou esse ano com mais de dez jogadoras com 2000 ou mais de rating em seu ranking. O nosso número inicial que era 47, obviamente era distorcido pela disparidade de rating das nossas duas melhores jogadoras e as demais integrantes,sendo a diferença dos tabuleiros 2 e 3, 150 pontos. O nosso rating médio era o maior da nossa história com 2114, o que certamente me deixava bastante esperançoso de que íamos melhorar a nossa participação em relação a Khanti-Mansinsky.

Chegamos a Istanbul dois dias antes para facilitar a nossa aclimatação, o que certamente foi uma boa medida por parte da CBX, e senti as meninas bastante animadas na reunião que fizemos na véspera do início.

Eu tinha uma estratégia de escalação pré determinada,que contei para as meninas ainda no Brasil que era,que cada uma jogasse quatro das cinco primeiras rodadas, para que todas tivessem chance de aquecer e mostrar sua forma,para a partir da 6ª rodada escalar a equipe de acordo com o que fosse melhor para aquele respectivo adversário. Para nossa infelicidade, ganhamos de WO um match que seria fácil e serviria para ganhar confiança contra a Líbia, pois em uma Olimpíada é importante usar a primeira partida por mais fácil que seja para tirar a tensão pré-torneio. Outro problema que esse WO me causou, é que para que uma de nossas jogadoras pudesse ter chance de norma, ela só teria direito a um descanso a partir daquele momento, já que o número mínimo de partidas para postular as normas é nove.

O nosso revezamento ia acontecer de maneira decrescente, descansando o 5º tabuleiro, Suzana na 1ª rodada até chegar ao nosso 1º tab, Vanessa Feliciano na quinta rodada, mas com a vitória por ausência o revezamento teve que durar até a sexta rodada. No dia seguinte tivemos a “agradável” surpresa que enfrentaríamos a Rússia, a atual campeã olímpica. Com Suzana entrando no lugar da Artemis, nosso grande objetivo,era aproveitar ao máximo a experiência e evitar perder de zero se possível. Na minha opinião, esse foi um grande match para a gente, pois graças a termos acertado algumas preparações e também algum menosprezo por parte das russas, na abertura estávamos melhor em três dos quatro tabuleiros! Infelizmente o sonho não durou muito, Suzana inverteu um lance que tínhamos preparado, e aos poucos perdeu a vantagem e foi lentamente superada pela Pogonina. Gazola depois de ter vantagem decisiva contra a ex-campeã mundial Alexandra Kosteniuk, e contar inclusive com arremate, perdeu sua chance e rapidamente sucumbiu. Como Juliana ficou inferior desde a abertura, sobrou pra a Feliciano tentar evitar o esperado 4 a 0 contra a atual campeã euroéia, Valentina Gunina. Em uma partida cheia de reviravoltas onde as duas estiveram ganhas em algum momento, o empate acabou sendo um resultado justo e histórico para o Brasil.

Como curiosidade, no dia que consegui conversar com o Kramnik, citei o “fxe4” jogado por Feliciano nessa partida, que é uma novidade em uma linha que ele inventou para as brancas, e ele depois de olhar pra cima pra ver se havia analisado essa possibilidade prometeu que ia ver a partida! Um match que nos deu moral e a confiança para o próximo confronto.


No dia seguinte, uma vitória convincente contra El Salvador nos deixou em ótima posição e a certeza de um match duro na próxima rodada. Seguindo o revezamento, saquei a Terao da equipe, o que obviamente nos enfraqueceu, mas era importante que todas tivessem pelo menos um descanso para estarem em boas condições para as rodadas decisivas.

A Bósnia é uma equipe forte e mais experiente que a nossa e isso foi sentido no match, a verdade que apesar de teoricamente equilibrado, o match foi convincentemente vencido por elas e só não foi pior porque Feliciano operou um milagre e salvou meio ponto depois de pendurar um peão no meio-jogo.

Na 5ª rodada era a vez da Feliciano descansar,o que veio até em um bom momento, pois ela estava bem chateada com o seu jogo contra a Bósnia. Obviamente como todo técnico de qualquer modalidade no Brasil, teve bastante gente que criticou a decisão,mas, esse descanso foi providencial para ela recarregar as energias e poder fazer um bom sprint final.

Esse match acho que foi nosso pior momento na Olimpíada, pois apesar da Dinamarca ser favorita de rating em três dos quatro tabuleiros, o match parecia lindo para nós e estávamos completamente ganhos nos tabuleiros dois, três e quatro! Infelizmente não era nosso dia, perdemos nesses três tabuleiros e dessa vez foi a Terao que transformou uma derrota certa em uma vitória milagrosa. Esse match teve duras consequências e baixou bastante o moral da equipe, em especial o da Vanessa Gazola, que apesar de ter jogado contra três adversárias com mais rating, ficou completamente ganha em duas dessas partidas, mas não somou nenhum ponto. Depois desse match Gazola perdeu totalmente a confiança e não pode repetir as ótimas participações que teve em Dresden 2008 e na Rússia em 2010.

Depois dessa rodada,veio o providencial dia de descanso onde a maioria passeou pela bela Istanbul. Uma bela janta no Burger King foi o suficiente para voltarmos com outro ânimo para a sequência do torneio. Uma vitória tranquila contra a Albânia na 6ª rodada era tudo que precisávamos para voltar com boa moral para as rodadas decisivas. Nesse momento avisei as meninas que minha ideia era manter Feliciano e Terao em todas as partidas restantes, já que além de ostentarem os maiores ratings, nossa performance no 1º e 2º tabuleiros incrivelmente estavam bem melhores que nos tabuleiros de baixo.

Na 7ª rodada um ótimo empate com a ex-república soviética da Moldávia mostrou novamente que jogando com Feliciano e Terao a equipe sobe muito de patamar e eu até avisei a torcida aqui no Brasil através do Facebook ,para eles ficarem calmos, que eu não tiraria mais Pelé nem Coutinho do time [risos].

Na 8ª rodada novamente o time jogou de forma bastante homogênea e vencemos por 4 a 0 a Costa Rica. Destaque para bela partida de Artemis que mostrou o seu melhor xadrez e foi uma das raras ocasiões onde o tempo não foi um problema para ótima jogadora santista.

Na 9ª rodada mais um match duro contra a equipe sueca, e com boas vitórias de Feliciano e Terao e um importante empate de Gazola no terceiro, vencemos pela diferença mínima e continuávamos invictos na segunda metade do torneio. Nesse momento confesso que eu mesmo estava eufórico e fiz o possível para não passar esse sentimento para equipe. Sabíamos que estávamos fazendo história e já imaginávamos dois matchs duros nas duas últimas rodadas, mas, a verdade é que nem nos nossos piores pesadelos imaginávamos que o destino seria tão duro com a nossa equipe.

Na penúltima rodada, cheios de ânimo pegamos a fortíssima equipe da Bielorrússia e elas eram favoritas nos quatro tabuleiros. Feliciano e Terao seguiam firme rumo às normas de WGM e tinham que enfrentar agora adversárias com mais de cem pontos de vantagem. Feliciano de brancas não tirou vantagem na abertura e a partida seguiu seu rumo normal e o empate foi acordado logo depois de chegado o controle de tempo. Terao jogou bem a abertura conseguindo vantagem decisiva contra a famosa WGM Anna Sharevich, e merecia a vitória que adeixaria com uma mão na norma. Infelizmente escolheu um caminho arriscado e a derrota foi bastante dolorosa matando as chances de conseguir a norma dupla de WGM. No terceiro e no quarto Gazola e Chang tiveram suas chances de segurar mas a maior categoria das rivais fez com que o match terminasse 3,5 a 0,5 para as favoritas.

Na última rodada tínhamos várias equipes interessantes para enfrentar, mas plagiando o MI Rodrigo Disconzi, ”o destino nos uniu à República Tcheca”e quando eu fiquei sabendo do emparceiramento por intermédio do amigo GM Felipe El Debs, confesso que levei um choque.

Para se ter uma ideia da força das nossas rivais, a quinto tabuleiro, ou seja, a reserva, tinha mais rating que o nosso primeiro. No meu interior eu já sabia que até um empate no match seria um milagre. As meninas entraram determinadas,mas em pouco tempo as Tchecas já tinham 3 a 0 em seu favor. Para salvar o dia a nossa heroína olímpica Vanessa Feliciano ganhou de maneira contundente de pretas e dessa maneira fez jus às suas duas primeiras normas de WGM e com uma performance de 2428, fez a maior performance de uma jogadora brasileira em todos os tempos.

Na hora que ela acabou a partida, nos abraçamos e na minha cabeça veio um filme de tudo que passamos juntos desde o final de 2007 quando iniciamos nossa parceria, até esse grande momento. Lembrei de vários “sábios” que profetizaram o fim da carreira dela quando ela engravidou e dos vários momentos de incerteza que ela passou sem saber como se adaptaria a nova condição de mãe, esposa e dona de casa.

Como costumo dizer nos momentos de vitória devemos lembrar sempre de quem esteve conosco nos piores momentos, os de derrota e decepção, pois quando vem a vitória,o mundo todo é seu amigo e “sempre”gostou de você. É importante lembrar que mesmo com as duas derrotas nas rodadas finais, ficamos na frente da poderosa Argentina.

Fico com a sensação de que poderíamos ter, tranquilamente, chegado entre as trinta primeiras, caso cada uma produzisse no seu limite, mas,a verdade é que jogamos um torneio duríssimo e tirando o match contra a Dinamarca, perdemos contra adversários contra os quais ainda não podemos competir em igualdade de condições. Nos matches que éramos favoritos, fizemos cem por cento.

De bastante positivo deve se destacar o torneio quase perfeito jogado pela Feliciano e a ótima performance da Terao, que pela terceira Olimpíada consecutiva joga bem e ajuda muito o trabalho de qualquer treinador. Uma observação que eu faço é que faltou uma jogadora com perfil de liderança e poder de aglutinação para fazer o papel que desempenhou a WIM Joara Chaves na Olimpíada de 2008, espero que dentre as jogadoras que farão parte da próxima Olimpíada possa aparecer alguém com esse perfil para que possamos ter uma performance ainda melhor.

Para encerrar esse “balanço” da nossa participação em Istanbul, gostaria de agradecer as meninas por toda a colaboração e espírito de luta durante todo o torneio , ao Pablyto e todo o staff da CBX por acreditar mais uma vez no meu trabalho. Com a entrevista dada pela WIM Tatiana Ratcu se abre a possibilidade de formarmos um “dream team” na Olimpíada de 2014,e cabe ao presidente formular uma diretriz para esse novo ciclo olímpico.

Espero que em um futuro próximo possamos ter mais meninas realmente se dedicando a estudar xadrez,pois só dessa forma nós faremos o xadrez feminino ser mais respeitado no Brasil.

MF Álvaro Aranha

Um comentário em “Reflexão sobre a participação da equipe olímpica feminina em Istanbul 2012

  • 13/10/2012 a 13:53
    Permalink

    Eu acho que a Feliciano merece virar WGM depois dessa olimpíada, pois ela fez uma ótima olimpíada e acabou invicta!

    O Brasil teria levado um 4×0 da Rússia se não fosse ela para arrancar meio pontinho!

    Parabéns Feliciano, você merece!

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